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Em legítima defesa preventiva do filme “Marighella”

Marighella (2019) é o mais novo filme de Wagner Moura, estreando como diretor no cinema brasileiro. Nas palavras do renomado ator popular, o filme não pretende ser um trabalho documental, mas, sim, uma obra de drama histórico. O protagonista desse filme é nosso eterno Comandante Carlos Marighella, ex-deputado federal constituinte, revolucionário comunista, poeta e guerrilheiro, que foi assassinado pela ditadura militar em 4 de novembro de 1969. Não podemos dizer muito mais sobre o filme em si, pois ainda não assistimos, nem tivemos acesso a maiores informações além das críticas estrangeiras, e dos comentários dos atores e do próprio diretor.

As primeiras críticas, em destaque as dos jornais alemães Der Tagesspiegel (TAZ) e Deutsche Welle (DW), foram abertamente políticas e infelizes, e parecem encontrar certa ressonância na opinião historicamente hegemônica do campo progressista no Brasil, a da social-democracia, do social-liberalismo e do vexatório eurocomunismo revisionista. As críticas reafirmaram o discurso reacionário anticomunista (apresentado eufemisticamente como “moderado”) de que o filme Marighella retrata um “bom terrorista”, que “só na América Latina e no Brasil a crença na pertinência da luta armada parece intocada”, e (talvez o argumento mais deslocado da realidade brasileira) que “o filme revela um corte significativo na mentalidade do populismo de esquerda na América Latina e como este, hoje, ajeita a história a seu gosto”. Em uma simples análise fria da escolha das palavras desses jornais podemos perceber que “lutar contra um Estado repressivo e opressivo” é considerado “terrorismo”, porque não é um direito de ninguém exigir do Estado a garantia do direito na busca pela felicidade e prosperidade. E que “a crença na luta armada” é algo terrível, mesmo que Marighella e outras pessoas que com ele compuseram a guerrilha tenham oferecido “a própria vida para a libertação nacional de um Estado fascista”. E chega a ser absurdamente hilário o argumento de que o “populismo de esquerda que, hoje, ajeita a história a seu gosto”, já que isso simplesmente não é verdade, nem está perto de ser uma verdade. É uma opinião forçosa, desprovida de fatos, do liberalismo europeu sobre a dura batalha da esquerda latino-americana, que com seus acertos e erros tenta retirar a condição de gritante dependência econômica, política, e até mesmo cultural, na qual os países da América Latina foram submetidos à força por séculos de colonização exploratória das nações europeias e pela atual neocolonização imperialista estadunidense. As críticas desses jornais não são críticas ao filme, são críticas à realidade, à verdade, aos fatos históricos, são evidentes artigos de falsificação histórica!

A luta armada contra a ditadura militar brasileira foi a expressão última da única possibilidade de ação política diante da supressão das mínimas liberdades democráticas. Marighella, Joaquim Câmara Ferreira, Zilda Xavier Pereira, e tantos outros e outras camaradas não eram aventureiros ou loucos, ao contrário, eram comunistas que escolheram lutar da singular forma como a conjuntura permitia, mesmo que o destino disso fosse o sacrifício da própria vida. Escolheram isso no lugar do triste, todavia confortável, exílio. A acumulação de forças da resistência armada, mesmo com a perda incalculável de suas lideranças, foi fundamental para a legitimação histórica do discurso futuro dos movimentos de massa pela reabertura democrática. Os outros aspectos que pavimentaram a retomada da democracia burguesa não merecem maior atenção nesta nota, tendo em vista que aqui apenas fazemos questão de escrever aquilo que a “esquerda democrática” sempre tenta apagar da história, mas jamais conseguirá: Marighella e nossos camaradas antepassados, revolucionários comunistas, entregaram suas vidas por um novo Brasil, e com esse gesto elevado acabaram contribuindo decisivamente no acúmulo de forças da derrubada do regime militar.   

Por outro lado, os influenciadores digitais mais conservadores insistem na tecla de que o filme faz apologia à violência, mesmo sem terem visto; além de mentirem divulgando uma “fake news” (notícia falsa) de que Wagner Moura “teria usado 10 milhões de reais da Lei Rouanet” para fazer o filme, quando em verdade não houve qualquer captação por lei de incentivo à cultura. Ironicamente, a bolha de rede social conservadora que condena o filme Marighella por apologia à violência nunca teve problema em recomendar e festejar filmes que retratam violência explícita e até mesmo sadismo, como por exemplo “Tropa de Elite” (também com Wagner Moura) e “Narcos” (série sobre o narcotráfico, também com Moura). Aliás, a violência faz parte dos produtos da indústria do entretenimento. Porém, os canalhas, que dizem amar a liberdade de expressão, prometem boicote ao filme Marighella e anseiam por um filme sobre o facínora Brilhante Ustra, coronel torturador dos idos ditatoriais. Enfim, o problema não é a violência, o problema é o simbolismo de Marighella na disputa das emoções e dos sentimentos no cinema.

Há ainda aqueles que reivindicam uma suposta “branquitude” de Marighella. Reclamam que “Seu Jorge”, ator escolhido, não parece com Marighella. Essas críticas são comuns e frequentes, até mesmo em filmes e séries que fazem adaptações de quadrinhos (alienígenas sendo interpretados por atrizes negras). O que incomoda não é a falta de semelhança, é um ator negro estar na “telona” em protagonismo, é o velho e maldito racismo! De fato, Marighella não era “negro retinto” como Seu Jorge. Marighella afirmava ser “mulato”, uma variação popularmente denominada para negros de pele menos escura, um tipo extremamente comum em nosso país profundamente miscigenado. Afinal, Marighella era filho de um imigrante italiano, senhor Augusto Marighella, com uma brasileira negra, senhora Maria Rita do Nascimento, baiana descendente de escravos haussás, que participaram da revolta dos malês.

Embora seja conhecido que o músico Mano Brown, então primeira opção, não teve condições de agenda para o papel, tanto na coletiva de imprensa quanto em outras declarações nas grandes mídias, ficou nítida a linha do diretor Wagner Moura na escolha de Seu Jorge para conectar a luta revolucionária de “Mariga” com uma “versão atualizada” da luta antirracista. Contudo, com o devido respeito democrático à total licença artística de Moura, cumpre a nós, comunistas, humildemente entusiastas da continuação da obra marighellista, frisar, neste período de dispersão identitária pós-moderna, de que os comunistas sempre travaram o bom combate contra o racismo, ora opressão da ideologia elitista das classes dominantes. Foram os comunistas que elegeram o primeiro negro no país, que também foi o primeiro negro candidato à presidência da república, Minervino de Oliveira. Foram os comunistas que apoiaram estruturalmente a luta dos povos africanos pelas independências de seus países. Foram, são e seguirão sendo os comunistas aqueles e aquelas que plenamente combatem o racismo e todas as opressões, atacando a raiz do sofrimento humano: a exploração do Homem pelo Homem.

Negro ou mulato, tanto faz, pois verdadeiramente Marighella foi, antes de qualquer coisa, um homem do povo brasileiro na luta pela libertação nacional, um comunista do Brasil na busca pela emancipação humana, um ser iluminado que amou nossa gente, nossa pátria, que dedicou sua vida pela mais generosa causa da humanidade.

É difícil induzir quais foram as intenções de Wagner Moura ou sobre os vários significados que o filme possa passar. A categoria artística, geralmente mais vinculada aos pensamentos progressistas, é sempre a primeira a ter sua liberdade de expressão cerceada, por diversas formas, em governos reacionários, como este atual. É justamente por isso, que recomendamos para que assistam ao filme. Prestigiem o nosso cinema popular brasileiro! Prestigiem os nossos artistas de coragem, que colocaram suas carreiras em risco por este filme! Prestigiem esse grande artista popular de notório destemor, Wagner Moura! Agitem e propaguem o nosso comandante Carlos Marighella!

Lotar as salas de cinema para o filme “Marighella”! Organizar sessões populares nas ruas, nos bairros, nas escolas, nas universidades, com trabalhadores e com a juventude! Popularizar mais e mais o nome e a obra de Carlos Marighella! Viva o Pensamento-Ação de Marighella! Viva o Marighellismo, justa aplicação do marxismo-leninismo no Brasil! 

Não precisamos assistir ao filme para defender preventivamente esta obra singular de crucial recordação daquele que não se foi: Marighella Vive!

 

Brasil, 22 de fevereiro de 2019; ao centésimo oitavo ano de imortalidade do Comandante Carlos Marighella.

A Secretaria de Comunicação da Organização A Marighella – CPR.